segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Downtime Balasar

O tempo e a luz
01 , Alturiak - Após reencontrar-se com a Companhia do Dragão, contou-lhes a experiência que passará dentro da provação. Sentia-se livre, leve. Sentia novamente o brilho e o olhar protetor de seu Deus. A presença que antes fora negada. Decidiu esquecer-se por um momento dos perigos externos e viver aquele momento.

Sentou-se em uma das pontas da mesa, onde podia ver todos se saciando com a comida oferecida por seus semelhantes. Provou dos pães, do vinho servido, bateu canecas com o anão, discutiu com a elfa da lua sobre as viagens e das bagunças do “novo” companheiro, a ursa. Ouviu das histórias e canções do bardo, que subira na mesa, para apresentar suas performances, junto ao alaúde. Aproveitou da harmoniosa sensação que o momento proporcionava, enquanto o sol seguia seu rumo, em direção ao leito das montanhas, onde repousaria, dando espaço a lua, que tomava seu lugar de direito, brilhando na escuridão da noite.

E assim, aconteceu. A luz alaranjada se esvaziou, enquanto a luz esbranquiçada espreguiçava sobre as frias paredes, mas o pouco que entrava pelas frestas das janelas do templo de Bahamut, brigavam com as luzes avermelhadas, que surgiram no momento em que alguns draconatos acendiam velas e castiçais espalhados sobre o grande salão.

Alguns sacerdotes aproximaram da mesa, avisando que se retiraram do recinto, mas que os aventureiros poderiam permanecer, se assim desejasse, mesmo que fosse visível que alguns já estivessem prontos pra dormir. Thorin já repousava a cabeça sobre um pão, hora tentava beber mais alguns goles de cerveja, mas voltava a se acomodar.

De longe, era possível ver o draconato de escamas prateadas assentir com a cabeça e agradeceu a hospitalidade, talvez se desculpando pela bagunça. O bardo, ainda alegre, perseguia uma das ajudantes do templo, uma draconata, pelos corredores, enquanto ela tentava distância-se, terminando de acender as velas fixadas às paredes. Talvez fosse a necessidade de terminar o serviço?

O draconato de escamas prateadas juntou a elfa, que carregaram o anão até quarto. Depois a acompanhou-a até a porta de seu quarto, deixando a entender que se encontrariam no outro dia, para verificar a biblioteca da cidade. Havia muito a ser discutido e muito a ser pesquisado.
Andou alguns minutos até encontrar a porta de seus aposentos, próximo ao fim de um corredor. Tomou um longo momento, observando a mobília, característica dos draconatos. Lembrava seu velho templo. Depois, passou o tempo necessário despindo-se, tarefa difícil para realizar sozinho, mas possível, considerando a armadura feita de mithril. Desenrolou o cordão que envolvia seu punho, segurou-o entre punho cerrado e deixou se cair sobre a cama.


O Ovo e a montanha
O que deveria ser uma manhã de outono, onde o calor do sol brigaria por espaço, junto aos ventos gélidos que carregavam as folhas, fracas e alaranjadas, pela estação que viria a seguir, soava como o meio do inverno. O frio incomodava o tato do draconato.

Suas escamas, arrepiadas, sua boca, trêmula, reagindo a ausência do calor.

Envolveu se com os próprios braços, esfregando se, na inútil tentativa de gerar calor. Mesmo acostumado, o frio parecia cortar sua resistência e tocar seu âmago.

Levantou-se, procurando pelo que se envolver, mas sentiu a umidade entre os dedos; um amontoado de neve, que o vento varria por entre o fino vão entre a pedra e a porta. Suas coisas pareciam não estar mais ali. Ao invés disso, havia, ao lado da porta, seu antigo cajado de viagem. Novo como um dia fora, quando Balazar decidira iniciar sua viagem, ao topo da espinha do mundo. E como naquele mesmo dia, não existiu hesitação. Tomou para si, o cajado, sacudiu o corpo, forçando-se a esquecer as dores musculares. Um passo adiante e a porta parecia nunca ter estado ali. Estava na base de uma montanha, próximo a uma grande escadaria, cercado pelo branco e o cinza, que se misturavam como triste canção, sem início, fim ou sem direção.

O draconato forçou-se a se mover, resistindo a força do vento. Deu alguns passos contra as pedras que formavam a precária escadaria. Mas aquilo era difícil. Não conseguia sentir seu corpo como antes. A energia da vida, que conectava tudo a todos, assim como seus mestres um dia mostraram.

Foi então algo pequeno, uma pedra, rolou sobre a neve, parando ao seu lado. Com uma forma ovalada, com sua tonalidade prata, esbranquiçada pelo reflexo do céu e da neve. O draconato se abaixou, reconhecendo a forma, apesar de tê-la visto poucas vezes, no tempo de criança. Sentiu a vontade de tocá lo, mas o ovo se partiu, lentamente, enquanto pequenos braços de uma criatura acinzentada saia, lutando por espaço entre a dura casca escamada.

Balasar se sentiu maravilhado, observando a força da criaturinha, brigando pra respirar o frio ar da vida. E não demorou para que aquilo conseguisse sair por completo, se mostrando um pequeno draconato, com escamas tão claras quanto a cor da neve. O pequeno deu alguns passos, cambaleando. Suas pequenas pernas cederam, o derrubando sobre o monte de neve. Era curioso ver uma criança depois de tanto tempo.

Ela logo se levantou, tirou a neve de cima de si, encarou os olhos do maior, esticou se, como se tentasse passar confiança, ao estufar o peito. Pobre coitado, estava tremendo tanto quanto o draconato maior. Mas isso não a impediu de tomar seu rumo. As pequenas perninhas começaram a abrir caminho entre a neve e logo o pequeno já se esforçava para subir o primeiro degrau, tão grande quanto ele, o que o fazia se agarrar na borda e escalar.

Balasar sabia que não podia ajudá-lo, assim como ninguém o ajudou quando fora sua vez, no passado. Um costume de seu clan e daqueles que entregavam seu destino às mãos do templo de Bahamut. Era algo que tinha que ser superado. E depois de subir o terceiro degrau, as coisas ficaram mais fáceis. O pequeno pegava rápido, o jeito. E isso causava sorrisos no outro, que se sentia orgulhoso. E após algum tempo observando, se pôs ao lado do menor, subindo.

Enquanto o menor lutava para alcançar a borda e passar a perna por cima, para tomar o próximo degrau, o maior lutava com o frio e a ausência de força. E assim, seguiram, até a chegada da noite, um, ágil como só uma criança pode ser e outro, forte como um adulto deveria ser. Mas a noite fora carregada pela ventania e a neve, dolorida como navalhas, ao tocar a pele, trazendo consigo a escuridão.

E no breu, sobre a fraca luz da lua e das estrelas, o draconato mais velho puxou o menor para próximo as pedras e o envolveu, protegendo o do frio. Passou a noite em claro, fazendo o possível para não morrer congelado.

Na manhã seguinte, acordara assustado com o movimentos que sentia entre seus braços e perna, enquanto o menor retirando a neve de cima de si, enchendo o peito de ar, com a mesma atitude confiante de antes. O menor não se demorou em tomar a atitude de correndo até as escadarias. O mais velho não demorou para se mover e tomar seu lugar ao lado do mais novo, que dessa vez parecia ter mais facilidade para subir os degraus.

E assim, seguiram as próximas luas, trazidas pelo vento, um crescendo e aprendendo, se tornando mais ágil, mais esperto. O outro, mais forte, reaprendendo seus limites, retomando suas forças, renovando seu espírito.

Foi então, no último degrau, que o draconato mais velho olhou para trás e observou o rumo da grande escadaria, quase que completamente coberta pela neve. A grande paisagem branca, o caminho abaixo, o ponto inicial, ao longe, pelo menos era isso que imaginou, olhando um ponto ao longe. O quanto tivera caminhado até aqui. O quanto ambos sofreram e cresceram nessa jornada que talvez tivesse durado dias? Meses? Difícil de contar. A neve podia pregar peças.

Teria perdido mais tempo observando aquela imensidão de branco e cinza, quando um raio de sol ofuscou sua visão. A frente o grande sol, nascendo, cobrindo toda a neve com seu esplendor. O calor sobre a pele, quente como o verão.

Ao seu lado, não mais a pequena criança, mas uma imagem de si mesmo, mais jovem, como quando deixará o templo, sorrindo como se estivesse orgulhoso do seu eu mais velho. Ele se curvou, voltou a se por ereto, colocou o punho cerrado sobre o peito, em seu rosto, outro sorriso.- O caminho a partir de agora, você já sabe qual é…- Com uma voz serena, que lentamente foi perdendo seu som, enquanto o vento levava a figura mais jovem, que se desfazia em partículas de neve. Um último clarão do sol, o forçou a fechar os olhos. Quando retomou a visão, embaçada pela luz, estava novamente, naquele quarto. Suas coisas ali, junto a mochila, as paredes de pedra, a mobília peculiar.

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